Infelizmente não podemos escolher o local e as circunstâncias do nosso nascimento, e se por vezes as coisas correm bem isto não acontece sempre, e aquilo que somos está fortemente condicionado por este primeiro lugar que nos acolheu...no bom da nossa história e no menos bom.
A família funciona como um campo dinâmico no qual interagem tanto os factores conscientes quanto os inconscientes, sendo que a criança desde o nascimento não é apenas influenciada pela família, mas é também um poderoso agente activo de modificações no seio familiar.
O primeiro factor da transgeracionalidade a ter em conta é que cada progenitor mantém internalizações das famílias de origem com os correspondentes estereótipos e conflitos.
Há uma forte tendência no sentido de que os conflitos não resolvidos pelos pais da criança, com os seus pais sejam mais tarde reeditados nos filhos, ou seja tudo se repete novamente, os conflitos que ocorreram, o tipo de relação, a incapacidadede expressar afectos, entre outros.
A título de exemplo, não raras vezes, uma mãe com relação muito intensa com o seu pai, pode menosprezar o marido dedicando-se inteiramente ao filho, fazendo com que desta forma a criança se torna uma imagem do avô, enquanto a mãe vai desvalorizando a imagem do pai, excluindo assim a figura paterna da educação da criança, tal como foi rejeitada pelo pai. Vinga-se assim no marido.
O mesmo é válido para o homem fixado na mãe, que aos poucos vai excluindo a mulher e fixando-se na sua mãe, muitas vezes através dos filhos, passando a esposa a fazer parte dos odiados da família, ficando vingado o desprezo que a mãe lhe devota.
Medos, conflitos, histórias , agressividade, mesmo modelo de relação conflitual entre pais filhos e entre o casal , percursos de vidas... Tudo isto muitas vezes se repete, mesmo aquilo que achamos que estava mal e que foi prejudicional, e que achamos que nunca iria acontecer connosco!! È a Repetição!!
Não raras vezes ouço os meus pacientes dizerem: "Isto assusta-me, começo a perceber que estou a ficar igual à minha mãe", ou "estou a fazer exactamente o mesmo que o meu pai e a repetir muitas coisas que odiava nele"!!
É claro que nada disto acontece de forma consciente e intencional. Tudo acontece de forma muito inconsciente, e por isso completamente fora do controlo de cada um de nós, mas que podem deixar marcas devastadores da saúde psíquica das crianças.
Os valores culturais, afectos, ansiedades, necessidades do ego, mal entendidos, segredos ocultos, são transmissões que não passam de forma indelével nas gerações.
A forma como os pais se vêem, a imagem que tem de cada um e que passam aos filhos, as necessidades de auto-estima, a definição de papéis como por exemplo a “ bode expiatório”, “orgulho de mãe”, “doente da família”, louco da família” são cumpridos dentro da família e fora dela, mantendo muitas vezes a aparente “sanidade mental” de todos os outros, que ao terem um identificado como doente, parecem estarem assim a salvo da doença, quando na realidade estão todos emersos em doença psíquica.
As famílias apresentam uma variedade de estruturas que pode ir do mais saudável ao mais doente. Podem ser famílias simbióticas (vivem e fazem tudo juntos), obsessivas, narcisistas (vivem de aparência para esconder as fragilidades e obrigam os filhos a performances de perfeição), paranóides (existem perigos em todo o lado, tudo é externo ao sujeito), fóbicas (alimentam nos filhos medos que são seus, tornam-nos hipocondríacos), depressivas, sadomasoquistas etc., ou então apresentam-se mentalmente bem estruturadas e sadias.
Uma família bem estruturada requer algumas condições básicas, tais como, distribuição de papéis, lugares, posições e atribuições, com a manutenção de um clima de liberdade e de respeito entre os membros.
É necessários existir limites e fronteiras na relação dos membros familiares.
Caso isso não exista e tudo fique confuso, borrado, em que se perdem os direitos, deveres e privilégios, como os lugares que cabem a um pai e a um filho então a insanidade mental está criada e vai passando de geração em geração.
É vulgar ouvir dizer de algumas famílias que se constituem doentes “ são todos assim, o avô também se matou, a mãe era depressiva”, no caso de famílias depressivas, ou em famílias psicóticas que gerações após geração vão surgindo casos de esquizofrenia em número considerável para ser considerado normal. São famílias que se organizam num psiquismo doente, passando aos filhos modelos de relação baseados em pressupostos de doença, muitas vezes não visível socialmente mas que se traduzem por exemplo em visitas exageradas a médicos, baixas, hospitalizações entre outros factos.
Qualquer das situações descritas vai influir na formação do psiquismo da criança, passando de pais para filhos numa transgeracionalidade que é preciso travar, para que a sociedade se constitua sadia.
A única forma de parar com esta transgeracionalidade doentia, ou seja modelos de funcionamento familiares disfuncionais em que a repetição acontece, é através da psicoterapia, quando os sujeitos param para pensar e começam a ser mais conscientes de si próprios, e dos seus actos, e compreendem em profundidade o seu funcionamento mental e como se construíram.
A Psicoterapia é o caminho ...
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