Por Joana Ferreira da Costa, In Diário de Notícias, 26 de Julho 2010
O DN foi conhecer as histórias de quem foi mãe dos netos. E ganhou uma vida nova.
Júlia Azevedo, de 56 anos, tornou--se mãe pela terceira vez quando trouxe a neta para viver consigo. "Dormia num carrinho de bebé que eu lhe dei, numa marquise em casa da avó materna", conta. Como o pai e a mãe da criança viviam fora do País, Júlia passou a tomar conta da neta de cinco meses. "Ela é minha", diz com um sorriso, "foi a melhor coisa que me aconteceu na vida". Aos oito anos, Erica trata sempre a avó por mãe. E Júlia foi a única que conheceu. A mãe biológica vive em Inglaterra e tem uma nova família. O pai, emigrante na Noruega, ainda lhe telefona às vezes.
Só aos cinco anos, quando a avó lhe contou, é que Erica soube que ela não era sua mãe. Lembra-se de se ter agarrado a ela num grande abraço: "Tu és sempre a minha mãe." Confessa que gostava de conhecer o pai, tal como aos irmãos, que resultaram de um casamento posterior, mas diz não sentir a sua falta. "Só sinto falta dos meus irmãos. O meu pai nunca quis saber de mim e eu também não quero saber dele."
Nos últimos oito anos, Júlia só lamenta uma coisa: que o filho nunca tenha querido ser um pai para Erica.
Romana foi avó aos 35 anos
"Foi o que me calhou, e eu recebi, ponto final", sintetiza Romana Silva, de 48 anos, quando pensa em João António, o neto que a filha lhe deu quando tinha apenas 13 anos. A mãe rejeitou a criança desde logo, e os avós acabaram por assumir a sua responsabilidade pelo bebé junto da protecção de menores. "Eu só não o pari", explica a avó, "tudo o resto eu tive de passar. Solange era ainda muito nova, precisava do meu apoio. Tive de os educar a um e a outro", bem como às outras três filhas do casal.
João António nunca se sentiu posto de parte, pelo contrário. A mãe era como uma irmã mais velha, mas ele sempre soube que era ela a sua mãe e procurava chamar--lhe a atenção. "Vês, Solange", dizia, "eu gosto muito da minha avó, ela ralha e dá-me mimos, ela é que cuida de mim". A luta da avó era fazer com que mãe e filho se aproximassem, fazendo-os passar tempo juntos. Mas só aos oito anos é que viu esse esforço dar frutos.
Com o pai aconteceu o mesmo, mas só depois de este o reconhecer como filho, aos cinco anos, por ordem do tribunal. "Eu é que acabei por obrigá-los, a um e outro, a criar uma afeição com o menino."
Hoje, vive com a mãe, mas a casa dos avós continua também a ser a sua. Com o pai mantém uma relação mais distante. "Às vezes vou dormir lá a casa, mas não é tanto por causa dele", apressa-se João António a explicar. "É por causa da minha irmã mais nova. Eu sempre disse à minha mãe que quando tivesse um irmão ia acarinhá-lo."
Leonilde ajudou a salvar a neta
Carinho também não faltou a Leonilde Bregeira, de 65 anos, quando acolheu em casa a neta de três meses, hoje com 18 anos. Foi ela quem alertou o Ministério Público para os perigos que corria Vanessa, entregue aos cuidados dos pais toxicodependentes.
"A bebé era um entrave na vida deles quando se zangavam", explica Leonilde. "Quando estava tudo mal era a menina que sofria."
Os pais de Vanessa, que se separaram pouco depois, visitam-na de vez em quando e a avó acabou por criá-la praticamente sozinha. Trabalhou muito para cuidar da neta e hoje teme não conseguir pô-la na faculdade. Emocionada, deixa escapar: "Preocupa-me que eu feche os olhos e ela não tenha ninguém." "Ela é a minha bonequinha de porcelana que eu guardei com muita estimação. Tenho muita vaidade nela, mas custa-me que ela nunca tenha uma palavra de carinho para mim."
Hoje, Vanessa tem vergonha de andar na rua com a mãe, por causa do seu aspecto, e evita o pai a todo o custo. "Não me sinto bem com o meu pai", explica. Como boa recordação da mãe lembra que foi ela quem a ensinou a fazer bolhas com a pastilha elástica.
"E eu não te ensinei nada?", pergunta a avó. O silêncio da neta é a resposta. Vanessa vive revoltada com a sua sorte, justifica Leonilde. "Ela tem um feitio complicado, não tem muita paciência", desculpa-se a neta.
Os psicólogos são unânimes em considerar que os avós não substituem os pais. "Os avós podem dar a educação, as regras, mas não é a mesma coisa", diz a psicóloga Maria de Jesus Candeias. "É fundamental para o desenvolvimento das crianças ser amado e desejado pelos pais. A sua ausência deixa marcas profundas na auto-estima e sentimentos de insegurança." Independentemente de todo o Amor que os avós possam dar.